Entrevista Exclusiva

Os Fonsecas

Conheça uma das bandas responsáveis pelo renascimento do rock humor.

21 de outubro de 2023

Texto: 

ilegas

Imagens: 

Otto Dardenne e Danilo Sansão

Nascido em 2019, o paulistano Os Fonsecas mistura o som do rock com humor em letras autobiográficas. Mas o conjunto começa a explorar um som mais “dark”, com elementos de música eletrônica, em “Estranho pra Vizinha”, que será o próximo álbum da banda e recentemente foi apresentado na Casa Rockambole, em Pinheiros. Nina Maia e Sherds participam com sintetizadores e intervenções eletrônicas.

Early life

A banda começou com Valentim no baixo, Caio na guitarra, Thalin na bateria e Felipe Távora nos vocais — todos músicos desde cedo. Essa reunião vem a partir da junção de dois projetos musicais de colegial: Tríade de Blume, com Valentim, Flora e Thalin, e Blend com Caio, Basak e Felipe. Felipe e Thalin se encontraram na aula de teatro, na qual Felipe convidou Thalin para tocar bateria na sua banda. Pouco depois, Basacchi, a baixista da Blend, saiu. Valentim, Thales e Caio decidiram juntar os projetos.

No final de 2018 — ou o chamado “ano da pior eleição”, por Valentim — ocorreu outro festival de música do Colégio Equipe. O evento foi o mote que faltava para os garotos decidirem se juntar de fato para tirar um som. 

Integrantes da banda Os Fonsecas. Foto: Otto Dardenne

Dançando-se para fora do útero

Os recém-encontrados Fonsecas, então, em meio a festas de colegial e festivais de música de escola particular, encontram o Estúdio Fiaca — hoje, Estúdio Mameloki — e, assim, dão seus primeiros passos no mercado fonográfico independente.

Otto Dardenne, dono do estúdio, escuta o som da banda em um show no Fiaca e decide produzi-los, no início, de perto até que aprendessem a andar com as próprias pernas.

Uma vez produzidos, precisavam entrar em um circuito de casas de show. Para isso, gravaram o EP de demos “Vou Citar Fatos” e o lançaram em 2019 no SoundCloud. A empreitada só não foi um fiasco total porque, até hoje, por meio dessas demos, os ouvintes têm acesso a narrativas pessoais inusitadas, transformadas em músicas compostas criativamente. Um exemplo é “Café”, escrito por Felipe Távora e que do qual deixamos o trecho: “Quente, muito quente. Tá queimando. Frio, muito frio. Joga fora. Faço outro”. 

Felipe comenta que a complexidade nunca foi o seu objetivo quando compunha, descrevendo as composições, sobretudo as primeiras, como algo “simples”, mas “embelezado”.

Capa do EP de Demos "Vou citar fatos"

Talvez Caio tenha a melhor forma de explicar esse estilo de composição. “As músicas d’Os Fonsecas, a maioria delas, não são existenciais. É algo corriqueiro, um dia-dia, visto de um jeito irônico, engraçado e até feio”. 

Essa abordagem “leve e humorada” sobre “as coisas comuns da vida” vem de uma percepção compartilhada por Valentim: “Todo mundo já escreveu sobre tudo. Então fica algo meio ‘Sobre o que vou escrever?’. Eu cheguei nessa conclusão não conscientemente, mas depois de começar a compor, eu acabo cantando sobre o que eu vivo, porque é a única coisa que é minha”. 

Felipe traz outro ponto, o do “subverter o simples”. Assim, essa temática se manteria no trabalho seguinte, um EP que lançado em 2020, com o nome “Fundo da Meia”.

O verde

Para além de café e achar que a vida é simples, o cotidiano de um músico de colegial é permeado pela maconha. Durante a entrevista, por entre cigarros bolados com tabaco, o cheiro de flor consumia o espaço e o tema canábico era sutilmente comentado. 

Não ironicamente, após serem questionados sobre o seu uso na composição de letras como “Aquele armário parece um caminhão; se botar gasolina e fogo, explode”, Felipe conta que o nome “Fundo da Meia” vem de seu antigo “kit pala”: uma meia, que quando tinha de ser raspada e não era possível ver direito seu fundo. Logo, precisava-se virá-la do avesso. “Por isso escrevi “Não consigo ver o fundo da meia”, diz ele.

Contudo, a maconha, apesar de estar muito presente no dia a dia dos integrantes, não é vista por eles como essencial para o processo criativo da banda. 

Não é o fundo do poço. É o fundo da meia

Capa do EP "Fundo da Meia"

Duas músicas, alguns arranjos e zero experiência de estúdio. Esse era o starter pack d’Os Fonsecas quando começaram a gravar "Fundo da Meia", em 2020. Desse modo, Otto e Ian — este último também do Estúdio Fiaca — direcionaram a pré-produção. 

As músicas foram rearranjadas e gravadas cruamente in live em dois dias na intenção de "razer na gravação a pegada e as dinâmicas de show". O resultado disso é um rock lo-fi bem grooveado e com vozes vazadas que abordam o cotidiano de forma por vezes indireta, por vezes direta e reta.

“JOÃO” seria ESTRANHO PRA VIZINHA? 

Capa do Single "João". Por Otto Dardenne e Os Fonsecas

Caio explica a diferença fundamental entre o primeiro EP e o novo álbum:

“Ainda que seja o primeiro álbum, ainda que seja uma coisa que a gente não tem plena consciência, foi muito diferente do processo de Fundo da Meia, onde os moleques não tinham nenhuma experiência de nada e precisavam de alguém pra ir guiando” explica Caio. “Porque nesse álbum teve um lance da gente chegar e fazer. A gente ficou uma semana trancado na Serrinha, que é um bairro rural ali de Bragança Paulista, num quarto, montou os instrumentos e, em uma semana, fizemos as demos do disco lá”. 

Valentim completa: “Essas demos diferentes das demos que fizemos, digamos num mesmo processo, para ‘Fundo da Meia’, já tinham muito mais uma consciência de sonoridade e serviram como uma ideia do que melhorar para o álbum”.

“Tínhamos essa ideia de ‘como tocar isso ao vivo?’, cuidado de gravar os instrumentos separados, camadas de guitarra, mesmo porque são duas, tem a do Thales Castanheiras também”, completa Caio, seguido por Thalin: “Na pós, ficamos numa nóia. Gravamos sem caprichar. Na pós, muitos mix, vai pra master e agora vai voltar pra mix. João foi o single porque, além de ser a música que melhor representa o álbum todo, foi uma das únicas que falamos ‘caralho. tá pronto’. Também foi a última que gravamos”.

Estranho pra caralho

No primeiro EP, foram tentadas experimentações com synths. Mas os músicos disseram nunca alcançar a sonoridade que queriam. Este primeiro álbum, “Estranho pra Vizinha”, então, decidiu arriscar na antiga proposta da banda e apostar pesado num som orgânico-eletrônico que reverbera nas apresentações ao vivo.

Para além disso, um som mais denso, macabro e sinistro. Letras mais metafóricas e alegóricas. Mas sem nunca perder a herança do humor, da simplicidade e da biografia.

Integrantes da banda Os Fonsecas. Foto: Otto Dardenne

BREAKING NEWS FOR HARD NEWS: FONSECAS VAZAM CAPA DO NOVO ÁLBUM

Para além dos temas cotidiano, humor e maconha, os Fonsecas possuem outra fixação: Um certo coelho. Por que? Thalin explica: “Meu irmão tinha um amigo que era artista plástico. Ele produziu um coelho muito parecido com aquele da imobiliária Coelho da Fonseca e deixou lá em casa, onde a gente ensaia. Então o nome vem disso, mas também é a capa de tudo: das demos, do EP, do João e a capa do álbum vai ser um coelho também. Pode ter certeza disso”.

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