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No final do arco íris, um pote cheio de lágrimas: o pós-punk dançante do Jovens Ateus

Banda de Maringá fez apresentação gótica e sinistra no FFFront.

9 de março de 2023

Texto: 

@_.ilegas

No final do arco íris, um pote cheio de lágrimas: o pós-punk dançante do Jovens Ateus

Saindo da Estação Vila Madalena, um arco íris inaugura o caminho que o Desconhecido trilharia no dia. Após muita chuva, o tempo finalmente decide dar uma trégua e os nossos correspondentes podem aguardar sequinhos a casa, que fica a alguns minutos do metrô, abrir.

Veem à distância os músicos do Jovens Ateus entrando e saindo do FFFront. Seus estilos góticos somam-se com o céu acinzentado. Seus coturnos amassam as poças. E suas mãos calejadas carregam os instrumentos para dentro do estabelecimento. 

Inesperadamente, as portas se abrem e a casa começa lentamente a se encher. O FFFront é todo decorado por quadros, luzes e também possui discos que podem ser postos para tocar. Na área externa, tem cadeiras do tipo “jardim”, com cinzeiros por perto. Lugar ideal para prosear fumando um, enquanto se espera o início do show.

Repórter em campo

Dário Gustavo, vocalista do Jovens Ateus, em tom de brincadeira, tratou o pré-show como se fosse um pré-jogo, dizendo que a expectativa é sempre a melhor possível e espera que seu time, o Jovens Ateus, de Maringá, conquiste os três pontos na capital paulista. Estão preocupados, pois é a primeira vez que jogam em São Paulo, mas têm muita fé nas ordens do professor “Mano Jesus” e em deus. Esperam um caminho glorioso e a vitória d’uma conquista. 

Gostam de São Paulo, particularmente da Galeria do Rock. Mas também curtem a cena de Maringá que, apesar de ser “pro interior do Paraná, tchê”, é muito boa e composta por músicos que, além de tocarem bem, “fazem acontecer”. Stone Birds, um psi garage rock, e Cambaya, um punknejo, são exemplos de bandas maringaenses inspiração para eles.

Desconhecido Juvenal entrevistando os integrantes do Jovens Ateus.
@fotosdepoisdobeck

Logo ao final da entrevista, nos chamam para entrar. O show ocorrerá no segundo andar, que é acessado por uma escada logo após ao bar. Chegando lá, uma sala gelada e bem iluminada. Um cubículo, no qual só há espaço para a banda e os fãs.

Antônio Bresolin, synth e drum, Bruno Deffune, baixista, Fernando Vallim, guitarrista, e Joao Manuel, lead guitar, são vistos passando som, enquanto esperam Dário aparecer. O fato da galera se avolumar cada vez mais em um espaço pequeno faz com que o intimismo reine. 

E nesse clima de aproximação de corpos, o vocal entra em cena, sobe ao palco e, sem cerimônia, pega o microfone…

Público aguardando início do show.
@fotosdepoisdobeck

Apresentação do Jovens Ateus
@fotosdepoisdobeck

Se o Delorean tivesse rádio

Uma bateria programada, acelerada e seca começa a tocar. Acompanhando ela, o baixo dança suavemente e vai crescendo aos poucos à medida que riffs de guitarra e o sintetizador ganham presença. O vocal grave canta o que uma garota triste e platonicamente apaixonada gostaria de ouvir. Tudo isso te leva para uma noite em que só se quer dançar os movimentos oitentistas.

Essa é a vontade geral, no que o chão se liquefaz em um colchão d'água. Dança e ondula acompanhando os passos, os pulos, os agitos. Parece desabar perante a vibração das poderosas caixas de som. Delas, saem acordes sinistros, físicos de tão densos, que acertam em cheio o corpo gótico. O coração gelado ferve a ponto de bombear sangue quente que faria até mesmo um vampiro se apaixonar. 

Paradinhas em que tudo fica em silêncio e não resta senão aquelas sonoplastias de “cowbell” presente em toda música dos anos 1980 que se preze. Uma planície digital e um tanto futurista, em que a chuva cai fazendo chiado de vinil. Uma pequena pausa para as pernas descansarem e ver que os rostos de todos ao redor ovacionam com os olhos a sonzeira. Uma placidez breve para que a darkwave te engula em dobro. O vocal rouco agora te lembra de fumar e os arpejos da guitarra se fazem escadas rolantes para uma época em que os shopping centers eram novidade.

O lead guitar incorpora o rock e faz caras e bocas dignas de uma noite de sucesso. O vocalista mantém sua mão na cintura de um jeito estranhamente sexy. O baixista se torna um só com o ritmo. O tecladista põe uma gagball em sua boca, como se dissesse “post-punk induz prazeres sexuais”.

Nenhum lustre foi ferido 

Na música Noite Eterna, o guita vai para a bateria. Uma nova estética sonora surge. O som analógico e acústico apresenta para todos uma espécie de punk-post-punk. Não à toa, os punks adoram e mostram sua aprovação na (des)forma de mini moshs, crowdsurf e pog.  

deus

Mas a banda não para por aí. Além de, ao longo de seu set, resgatarem referências de Depeche Mode e Sister of Mercy, o Jovens Ateus toca um cover de “Igreja”, dos Titãs, como bis. Na versão deles, a música ganha características noise, com um pai demoníaco gritando com o seu filho pequeno para ele ir para a igreja. A criança pequena e desesperada implora para que não, pois não gosta da igreja. O clima sufocante e opressivo mostra para todos o porquê eles são os Jovens Ateus.

As últimas palavras de um jovem ateu

A banda disse que as expectativas foram atendidas e elogiaram a qualidade de som do ambiente, ainda que isso trouxesse algumas surpresas desagradáveis. “Foi até qualidade demais para mim”, disse Dário, “porque estava me escutando até mais do que gostaria. Como, não tô acostumado a me escutar assim, fiquei com mais vergonha do que o normal”.

João falou sobre a diferença de proximidade entre o palco e o público. “Nos outros shows a distância era bem menor”, contudo ficou feliz que a galera tava curtindo. Tão feliz a ponto de incorporar o rock.

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