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Casaberta Drops ou oásis cultural no ABC

A experiência de um Juvenal em uma tarde ensolarada por São Bernardo do Campo

10 de maio de 2024

Texto: 

@jonga1000000

Imagem do Banner: 

Divulgação | Prefeitura de São Bernardo do Campo

Imagens: 

Jonga Souza

Em um domingo de muito calor, aproximadamente à 1h da tarde, uma movimentação de jovens alternativos tomou um bairro de classe média alta no ABC Paulista. Desciam do Uber e dos ônibus ou subiam a pé a Avenida Caminho do Mar. O destino era um só: o Parque Salvador Arena, que receberia as bandas terraplana, Morro Fuji e Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo.

O Casaberta Drops testava um novo formato, derivado do Festival Casaberta, que em maio de 2023 trouxe bandas como Far from Alaska, Terno Rei e Francisco el Hombre ao mesmo local. Mesmo em versão diminuta, com apenas um dia de evento e menos bandas, a arquibancada da concha acústica do parque seguia recebendo mais público a cada minuto.

A audiência era diversa. Em meio a centenas de camisetas de banda, era fácil avistar fãs de Slowdive, Cólera ou até mesmo Deftones. Todas essas pessoas estavam indo atrás de algo incomum nos espaços públicos das prefeituras do Grande ABC: um evento cultural que não fosse show de banda cover de Queen ou stand-up comedy de alguma subcelebridade do SBT.

Enquanto terraplana passava o som, encontrei com alguns membros da Morro Fuji. Esbanjando carisma, eles me contam sobre o frio na barriga antes de subir ao palco e as expectativas que uma tarde de sol no Rudge Ramos pode gerar. “O ABC é um ovo”, penso ao dar de cara com dezenas de amigos e conhecidos, todos de tribos completamente diferentes, mas curiosos com o que estava por vir no festival.

Antes do show começar, é necessário abastecer o tanque. Nas barracas de comida dentro do parque vê-se o preço do Chopp: R$19. Para não estourar o limite de gastos, algumas pessoas se dirigiram ao mercado do outro lado da rua. Era mais fácil se empanturrar de cerveja enlatada.

A terra foi plana por um momento

Com toda a timidez e introspecção que se espera de um shoegazer, os curitibanos da terraplana subiram ao palco para dar o tom do festival. De modo sorrateiro e sem muito alarde, fizeram o parque ser tomado por uma atmosfera esotérica e um tanto quanto melancólica. Ali se justificava a enorme presença de fãs do Slowdive. Os sulistas abriram o show da banda britânica em São Paulo em novembro de 2023.

O som das guitarras se confundia com a voz, que ressoava bem ao fundo como complemento da harmonia. O eco da concha acústica dificultava ainda mais entender palavras. Mas quem já está acostumado a ouvir esse gênero já sabe que sentir importa mais do que entender ou distinguir o que é dito. E isso foi feito com maestria.

Com os olhos maravilhados do público, cantaram músicas do álbum “Olhar pra Trás”, lançado em 2023, além de sons do novo repertório da banda. Também tiveram tempo de anunciar que em breve estarão no programa Cultura Livre, da TV Cultura. Com a atmosfera do festival posta, terraplana se despediu do palco deixando um sentimento de imensidão cósmica no coração das pessoas.

O bom filho...

Era a vez de uma das grandes revelações da cena do ABC Paulista nos últimos anos. Figurinha carimbada do Festival Casaberta, Morro Fuji deixou de figurar no catálogo de novidades que as pessoas precisam conhecer e passou a ser o grupo ‘It girl’ da região. Sempre trazendo novidades em seus shows, mudaram o clima uníssono do Salvador Arena para um espetáculo cheio de texturas sonoras.

Tudo era muito performático, desde a potência vocal da vocalista Angie ao swing do baixista Pietro Demarchi. Morro Fuji chamava o público para dançar, para chorar e cantar junto, com um entrosamento invejável entre todos os integrantes. Após as primeiras músicas, uma grata surpresa: Eduarda Abreu, da banda Cianoceronte, sobe ao palco para somar nas teclas.

Para encerrar o show de maneira visceral, a banda concentrou toda a sua energia na intensa ‘Meus Pés e Seu Apartamento’. Entregando uma apresentação redonda e um espetáculo de arrancar lágrimas dos olhos, o grupo se consolida como a atual queridinha do ABC, entregando versatilidade, profissionalismo e amor à arte.

A visita de Sophia

Por todo lado era Sophia Chablau. Nas camisetas, nos discos à espera de um autógrafo, na boca do público. Essa ansiedade se dissipou no melhor horário do dia: o pôr do sol, após um calor de mais de 30ºC. Para quem mora na região metropolitana de São Paulo, isso é equivalente a se sentir o próprio Bob Esponja ressecado.

A timidez inicial da vocalista, que subiu ao palco de cabelos presos e falando calmamente, foi contornada pelo público, que cantava todas as letras. Era o primeiro show desse porte que a banda fazia no ABC Paulista, o que claramente impressionou os artistas. “Tá cheio mesmo”, gritou Sophia, ao sentir o calor do público vindo da arquibancada.

Com o poder de fazer a Geração Z cantarolar “Palco”, de Gilberto Gil, e com a vocalista já de cabelos soltos, a banda entrega o ápice do show com o hit “Delícia/Luxúria’” música que foi tão dançada quanto cantada pelo público. Ao lado direito da banda, um casal da plateia se beija incansavelmente. Como se fosse o último momento de suas vidas. A performance culminou em centenas de jovens suados e felizes.

Dropou de verdade

Já com o público se dispersando, meia dúzia de gatos pingados insistiu em ficar próxima ao palco para dançar Cansei de Ser Sexy, Letrux e Ana Frango Elétrico no fechar — não literal — das cortinas. Alguns foram embora, outros foram beber nas imediações. 

O Casaberta Drops entregou o que poucos eventos no ABC entregam: bandas de qualidade, diversidade cultural, organização e acordo com São Pedro para manter o céu bonito.

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O link da vakinha é:
vakinha.com.br/4685528

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